OEA condena Estado brasileiro no caso da Guerrilha do Araguaia
Leia abaixo o trecho em que se declara a sentença.
A CORTE DECIDE,
por unanimidade:
1. Admitir parcialmente a exceção preliminar de falta de competência temporal interposta pelo Estado, em conformidade com os parágrafos 15 a 19 da presente Sentença.
2. Rejeitar as demais exceções preliminares interpostas pelo Estado, nos termos dos parágrafos 26 a 31, 38 a 42 e 46 a 49 da presente Sentença.
DECLARA,
por unanimidade, que:
3. As disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos são incompatíveis com a Convenção Americana, carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, e tampouco podem ter igual ou semelhante impacto a respeito de outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil.
4. O Estado é responsável pelo desaparecimento forçado e, portanto, pela violação dos direitos ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal e à liberdade pessoal, estabelecidos nos artigos 3, 4, 5 e 7 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em relação com o artigo 1.1 desse instrumento, em prejuízo das pessoas indicadas no parágrafo 125 da presente Sentença, em conformidade com o exposto nos parágrafos 101 a 125 da mesma.
5. O Estado descumpriu a obrigação de adequar seu direito interno à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, contida em seu artigo 2, em relação aos artigos 8.1, 25 e 1.1 do mesmo instrumento, como consequência da interpretação e aplicação que foi dada à Lei de Anistia a respeito de graves violações de direitos humanos. Da mesma maneira, o Estado é responsável pela violação dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial previstos nos artigos 8.1 e 25.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em relação aos artigos 1.1 e 2 desse instrumento, pela falta de investigação dos fatos do presente caso, bem como pela falta de julgamento e sanção dos responsáveis, em prejuízo dos familiares das pessoas desaparecidas e da pessoa executada, indicados nos parágrafos 180 e 181 da presente Sentença, nos termos dos parágrafos 137 a 182 da mesma.
6. O Estado é responsável pela violação do direito à liberdade de pensamento e de expressão consagrado no artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em relação com os artigos 1.1, 8.1 e 25 desse instrumento, pela afetação do direito a buscar e a receber informação, bem como do direito de conhecer a verdade sobre o ocorrido. Da mesma maneira, o Estado é responsável pela violação dos direitos às garantias judiciais estabelecidos no artigo 8.1 da Convenção Americana, em relação com os artigos 1.1 e 13.1 do mesmo instrumento, por exceder o prazo razoável da Ação Ordinária, todo o anterior em prejuízo dos familiares indicados nos parágrafos 212, 213 e 225 da presente Sentença, em conformidade com o exposto nos parágrafos 196 a 225 desta mesma decisão.
7. O Estado é responsável pela violação do direito à integridade pessoal, consagrado no artigo 5.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em relação com o artigo 1.1 desse mesmo instrumento, em prejuízo dos familiares indicados nos parágrafos 243 e 244 da presente Sentença, em conformidade com o exposto nos parágrafos 235 a 244 desta mesma decisão.
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E DISPÕE,
por unanimidade, que:
8. Esta Sentença constitui per se uma forma de reparação.
9. O Estado deve conduzir eficazmente, perante a jurisdição ordinária, a investigação penal dos fatos do presente caso a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 256 e 257 da presente Sentença.
10. O Estado deve realizar todos os esforços para determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas e, se for o caso, identificar e entregar os restos mortais a seus familiares, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 261 a 263 da presente Sentencia.
11. O Estado deve oferecer o tratamento médico e psicológico ou psiquiátrico que as vítimas requeiram e, se for o caso, pagar o montante estabelecido, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 267 a 269 da presente Sentença.
12. O Estado deve realizar as publicações ordenadas, em conformidade com o estabelecido no parágrafo 273 da presente Sentença.
13. O Estado deve realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional a respeito dos fatos do presente caso, em conformidade com o estabelecido no parágrafo 277 da presente Sentença.
14. O Estado deve continuar com as ações desenvolvidas em matéria de capacitação e implementar, em um prazo razoável, um programa ou curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos, dirigido a todos os níveis hierárquicos das Forças Armadas, em conformidade com o estabelecido no parágrafo 283 da presente Sentença.
15. O Estado deve adotar, em um prazo razoável, as medidas que sejam necessárias para tipificar o delito de desaparecimento forçado de pessoas em conformidade com os parâmetros interamericanos, nos termos do estabelecido no parágrafo 287 da presente Sentença. Enquanto cumpre com esta medida, o Estado deve adotar todas aquelas ações que garantam o efetivo julgamento, e se for o caso, a punição em relação aos fatos constitutivos de desaparecimento forçado através dos mecanismos existentes no direito interno.
16. O Estado deve continuar desenvolvendo as iniciativas de busca, sistematização e publicação de toda a informação sobre a Guerrilha do Araguaia, assim como da informação relativa a violações de direitos humanos ocorridas durante o regime militar, garantindo o acesso à mesma nos termos do parágrafo 292 da presente Sentença.
17. O Estado deve pagar as quantias fixadas nos parágrafos 304, 311 e 318 da presente Sentença, a título de indenização por dano material, por dano imaterial e por restituição de custas e gastos, nos termos dos parágrafos 302 a 305, 309 a 312 e 316 a 324 desta decisão.
18. O Estado deve realizar uma convocatória, em, ao menos, um jornal de circulação nacional e um da região onde ocorreram os fatos do presente caso, ou mediante outra modalidade adequada, para que, por um período de 24 meses, contado a partir da notificação da Sentença, os familiares das pessoas indicadas no parágrafo 119 da presente Sentença aportem prova suficiente que permita ao Estado identificá-los e, conforme o caso, considerá-los vítimas nos termos da Lei No. 9.140/95 e desta Sentença, nos termos do parágrafo 120 e 252 da mesma.
19. O Estado deve permitir que, por um prazo de seis meses, contado a partir da notificação da presente Sentença, os familiares dos senhores Francisco Manoel Chaves, Pedro Matias de Oliveira ("Pedro Carretel"), Hélio Luiz Navarro de Magalhães e Pedro Alexandrino de Oliveira Filho, possam apresentar-lhe, se assim desejarem, suas solicitações de indenização utilizando os critérios e mecanismos estabelecidos no direito interno pela Lei No. 9.140/95, conforme os termos do parágrafo 303 da presente Sentença.
20. Os familiares ou seus representantes legais apresentem ao Tribunal, em um prazo de seis meses, contado a partir da notificação da presente Sentença, documentação que comprove que a data de falecimento das pessoas indicadas nos parágrafos 181, 213, 225 e 244 é posterior a 10 de dezembro de 1998.
21. A Corte supervisará o cumprimento integral desta Sentença, no exercício de suas atribuições e em cumprimento de seus deveres, em conformidade ao estabelecido na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e dará por concluído o presente caso uma vez que o Estado tenha dado cabal cumprimento ao disposto na mesma. Dentro do prazo de um ano, a partir de sua notificação, o Estado deverá apresentar ao Tribunal um informe sobre as medidas adotadas para o seu cumprimento.
O Juiz Roberto de Figueiredo Caldas deu a conhecer à Corte seu voto concordante e fundamentado, o qual acompanha esta Sentença.
Redigida em espanhol, português e inglês, fazendo fé o texto em espanhol, em San José, Costa Rica, em 24 de novembro de 2010.
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